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Sobrecarga de trabalho: custo incalculável à vida do policial federal

Foto imagem Sobrecarga e adoecimento dos policiais federais

Sobrecarga de trabalho: custo incalculável à vida do policial federal

Os afastamentos do serviço por licença médica decorrem de problemas de saúde física e psicológica e alcança índices epidêmicos

Por: Magne Cristine

O número de adoecimentos dos policiais federais cresce a cada ano. Os afastamentos do serviço por licença médica decorrem de problemas de saúde física e psicológica e alcança índices epidêmicos. Uma das principais causas que desencadeiam essas patologias é a sobrecarga de trabalho a que estão submetidos rotineiramente.

É da realidade do policial federal desempenhar diariamente suas atividades normais inerentes às atividades fins do órgão (polícia judiciária, administrativa e de ordem) e ainda participar de escalas de sobreaviso e plantões. Nesse sistema, convive com a possibilidade de ser convocado para trabalhar a qualquer hora do dia, para atender às ocorrências diárias do órgão.

Diante da dinâmica da Polícia Federal e pequeno efetivo, o policial federal pode ser acionado fora da escala a qualquer tempo, seja em dias úteis, finais de semana ou feriados, para o fim de participar de ações policiais urgentes, como atuação em prisões em flagrante e cumprimento de mandados judiciais. 

Essas atividades comumente se destinam a integrar um grupo para uma operação policial nas primeiras horas do dia, ou seja, devem comparecer ao serviço já na madrugada, mesmo após o cumprimento da jornada de trabalho diária.

Diante do reduzido número do efetivo e da crescente demanda das apurações criminais que chegam ao órgão, o policial é acionado cada vez em maior número de vezes para os serviços extraordinários, paralelamente ao seu expediente normal, ensejando excesso de horas de trabalho diário e mensal, causando estresse e comprometendo o seu devido repouso e compensação orgânica.

Jornada de trabalho extraordinária

A jornada de trabalho no Departamento de Polícia Federal está atualmente disciplinada pela Portaria nº 1.253/2010-DG/DPF, de 13/08/2010, que dispõe que o servidor policial está sujeito ao regime de dedicação exclusiva, podendo ser acionado a qualquer instante ou lugar, independentemente de se encontrar em serviço ou em horário de descanso, devendo atender prontamente ao chamado, sob pena de infração disciplinar (Art. 2º).

A Portaria nº 1.253/2010 disciplina que em caso de jornada de trabalho superior a que estiver sujeito o policial, por necessidade do serviço, deverá ocorrer a compensação na proporção de uma hora de serviço extraordinário por uma hora de descanso, sob o controle e autorização da chefia imediata (art. 3º). 

Dispõe ainda que o início da compensação ocorrerá logo após o encerramento da atividade extraordinária (§ 1º), exceto se por razões de conveniência, necessidade ou continuidade do serviço público não for possível, devendo ocorrer até o último dia do quarto mês subsequente ao dia em que forem realizadas as horas extras, quando dar-se-á início a novo período, não sendo acumuláveis os dias de compensação.

Pelo que dispõe a citada Portaria 1.253/2010, as horas excepcionais trabalhadas pelos policiais federais, independentemente do turno em que ocorram, somente podem ser compensadas na proporção de uma hora de serviço extraordinário por uma hora de descanso, contrariando o que dispõe a Constituição Federal sobre a peculiaridade do trabalho noturno.

Ou seja, a “compensação orgânica” (descanso necessário para o organismo humano) pode ou não ocorrer logo após o encerramento da atividade extraordinária, uma vez que está condicionada à por razões de conveniência, necessidade ou continuidade do serviço público, que podem ser alegadas pela chefia imediata.

Assim, mesmo sem o necessário descanso, após ter trabalhado durante o dia inteiro, ou pela madrugada, o Policial Federal deve voltar ao expediente de trabalho, adiando a necessária compensação orgânica das suas horas extraordinárias trabalhadas. Aliás, esse sobrestamento de descanso pode então ocorrer até o último dia do quarto mês subsequente, também a critério da chefia imediata.

As disposições da Portaria nº 1.253/2010-DG/DPF contrariam os limites impostos pela Constituição Federal e o Regime Jurídico dos Servidores Públicos Civil da União – Lei nº 8.112/90, criando normas que reduzem o direito dos servidores policiais e ainda lhe impondo obrigações sobre-humanas, que substituem a qualidade pela quantidade de trabalho.

Disposições constitucionais sobre o trabalho

A Constituição Federal dispõe no artigo 7º, inciso XI, que são direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social a duração do trabalho normal não superior a oito horas diárias e quarenta e quatro semanais, facultada a compensação de horários e a redução da jornada, mediante acordo ou convenção coletiva de trabalho.

Já a Lei nº 8.112/90 dispõe que os servidores cumprirão jornada de trabalho fixada em razão das atribuições pertinentes aos respectivos cargos, respeitada a duração máxima do trabalho semanal de quarenta horas e observados os limites mínimo de seis horas e máximo de oito horas diárias (art. 19) e que somente será permitido serviço extraordinário para atender a situações excepcionais e temporárias, respeitado o limite máximo de 2 (duas) horas por jornada (art. 74)

Os policiais federais, na prática, possuem uma jornada de trabalho que difere da jornada dos demais servidores federais civis da União, uma vez que o serviço extraordinário destes é excepcional, enquanto que para os Policiais Federais o serviço excepcional é desenvolvido de forma rotineira. Ademais, os policiais federais frequentemente ultrapassam o limite máximo de 10 (dez) horas diárias de trabalho e de 40 horas semanais, definidos como limite pela Lei 8112/90 e essa sobrecarga de trabalho nem sempre conta com a imediata e necessária compensação orgânica.

Nexo de causalidade

O excesso de horas trabalhadas pelo Policial Federal é fator desencadeante (nexo causal) de inúmeras doenças do trabalho, psicológicas e físicas (LER/DORT – Doença Osteomuscular Relacionada ao Trabalho), que vem acometendo o seu efetivo. Some-se a isso outros fatores inerentes à natureza de “atividade de risco” que o policial desenvolve, cuja profissão é classificada pela Organização Mundial de Saúde – OMS como a segunda mais estressante do mundo, perdendo somente para os mineradores de carvão.

Todo esse contexto adverso vem comprometendo a saúde e a integridade física do policial federal que contabiliza inúmeros casos de afastamento por motivo de doença e aposentadoria por invalidez. Mas grave ainda, foram 16 (dezesseis) casos de suicídio em menos de quatro anos.

Apesar dessa natureza diferenciada de sua profissão, desde que foi implantada a remuneração por subsídio, os policiais federais deixaram de auferir de direitos constitucionais dispostos no Art. 7º, como: a remuneração do trabalho noturno superior à do diurno (IX); a remuneração do serviço extraordinário superior, no mínimo, em cinqüenta por cento à do normal (XVI) e o adicional de remuneração para as atividades penosas, insalubres ou perigosas, na forma da lei (XXIII), todos disciplinados pela Lei nº 8.112/90, arts. 61, 73, 74 e 75.

Determina a Constituição Federal no art. 7º que são direitos dos trabalhadores urbanos e rurais a redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança (XXII), bem como o seguro contra acidentes de trabalho, a cargo do empregador, sem excluir a indenização a que este está obrigado, quando incorrer em dolo ou culpa (XXVIII).

Direitos Humanos dos Policiais

A Portaria Interministerial nº 02/2010, que estabelece as Diretrizes Nacionais de Promoção e Defesa dos Direitos Humanos dos Profissionais de Segurança Pública não vem sendo cumprida pelo Departamento de Polícia Federal desde a sua publicação. Ela obriga ao Órgão a desenvolver programas de prevenção ao suicídio e a disponibilizar o atendimento psiquiátrico, núcleos terapêuticos de apoio e a divulgação de informações sobre o assunto, mas não saiu ainda do papel.

Diante do exposto, incumbe ao Departamento de Polícia Federal assumir a sua responsabilidade e adotar medidas urgentes com a finalidade de promover e proteger a saúde dos profissionais, bem como desenvolver ações preventivas e saneadoras dos adoecimentos.

Tais medidas evitariam a sobrecarga de trabalho e ainda promovem economia aos cofres públicos decorrente da redução no número dos afastamentos e aposentadorias por invalidez, e principalmente, o prejuízo incalculável à saúde e à vida do servidor policial federal e a sua família.

Publicações:

Revista do Sindicato dos Policiais Federais do Estado do Acre – SINPOFAC